quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Imunidades tributárias à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal - Paulo Vitor Coelho Dias*


1 - Introdução
A Constituição Federal prevê 33 (trinta e três) hipóteses de imunidades tributárias em relação às diversas espécies, a seguir distribuídas. São 07 (sete) hipóteses de imunidades genéricas (dizem respeito somente a impostos) e 26 (vinte e seis) hipóteses são imunidades específicas, sendo que 11 (onze) dessas são referentes a impostos, 11 (onze) relativas a taxas e 04 (quatro) dizem respeito a contribuições.
De há muito, já existiam as imunidades tributárias. As mesmas já eram previstas no texto da Constituição de 1967, exceto as hipóteses relativas às fundações instituídas e mantidas pelo poder público, às fundações dos partidos políticos e às entidades dos trabalhadores. A Constituição Federal de 1988 trouxe a expressão "sem fins lucrativos" prevista na alínea "c" do dispositivo constitucional supramencionado.
Apesar de a Carta Magna prever em seu artigo 150, § 2º, a extensão das imunidades tributárias às autarquias e às fundações mantidas pelo poder público, trataremos nesta monografia as decisões do Supremo Tribunal Federal, estendendo-se as imunidades para determinadas empresas públicas e sociedades de economia mista.
Pelo presente trabalho, extraiu-se a essência das imunidades tributárias previstas na Constituição Federal, pois a matéria encontra guarida em vários princípios constitucionais, tais como liberdade de expressão, acesso à cultura e à informação, livre manifestação de pensamento, capacidade contributiva, federalismo, autonomia municipal, difusão da liberdade política, proteção da liberdade sindical, liberdade religiosa no país e difusão das atividades de benemerência no âmbito social.
Desta feita, procuramos, com esta pesquisa, tentar sintetizar, de forma clara e concisa, este tema, através de pesquisas em obras doutrinárias e jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, sem perder a visão crítica de alguns aspectos que as cercam.
2 - Conceito
As imunidades tributárias estão insertas dentre as limitações constitucionais do poder de tributar, ganhando estatura, para o Supremo Tribunal Federal, de cláusulas pétreas, ou seja, imodificáveis por emendas constitucionais, em razão da impossibilidade destas estiolar direitos e garantias individuais previstos no artigo 60, § 4º, IV da Constituição Federal.
A Constituição Federal intitula a Seção II do Capítulo VI "Das Limitações ao Poder de Tributar" e, dentro dela, insere, as imunidades tributárias propriamente ditas e os demais princípios de normas reguladoras dos direitos e garantias individuais, como legalidade, irretroatividade, anterioridade, isonomia, vedação ao confisco, liberdade de tráfego e outros.
Em análise aos limites do poder de tributar em relação aos princípios e às imunidades, podemos extrair a seguinte lição de Aliomar Baleeiro:
Os princípios e imunidades geram os mesmos efeitos: limitam o poder de tributar. Mas os princípios são normas e diretrizes gerais, que não estabelecem a incompetência tributária sobre certos fatos ou situações determinados, enquanto as imunidades:
1. são normas que somente atingem certos fatos e situações, amplamente determinadas (ou necessariamente determináveis) na Constituição;
2. reduzem, parcialmente, o âmbito de abrangência das normas atributivas do poder aos entes políticos da Federação, delimitando-lhes negativamente a competência;
3. e, sendo proibições de tributar expressas (ou fortes), têm eficácia ampla e imediata;
4. criam direitos ou permissões em favor das pessoas imunes, de forma juridicamente qualificada.(01)
De acordo com o autor supracitado, podemos conceituar imunidade tributária da seguinte maneira:
É a norma que estabelece a incompetência. Ora, estabelecer incompetência é negar competência ou denegar poder de instituir tributos, conjunto de normas que só adquire sentido em contraste com outro conjunto que atribui ou concede poder tributário. Conjunto só inteligível se logicamente se pressupõe um outro conjunto, por ele reduzido ou delimitado: o das normas atributivas de poder.(02)
Para Hugo de Brito Machado:
Imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação de competência tributária.(03)
Frise-se que as imunidades demarcarão "campos" dentro dos quais não poderá haver a incidência tributária, sendo, portanto, "áreas de intributabilidade". A imunidade pode ser considerada o reverso da competência tributária.
Nesse diapasão, como as imunidades tributárias constituem normas impeditivas de competência tributária, convém salientar alguns atributos tratados por Regina Helena da Costa,(04) a saber:
a) privativa ou exclusiva porque se refere somente às pessoas, bens e situações expressamente indicadas no texto constitucional;
b) indelegável, visto que não pode ser imputada a outrem;
c) incaducável ou imprescritível, porque mesmo que não exercida por longo tempo não impõe a extinção do direito público subjetivo;
d) inalterável, já que a pessoa beneficiada a recebe da constituição e não tem a possibilidade de modificá-la;
e) irrenunciável,(05) visto que a pessoa imune não pode abrir mão da imunidade, mesmo que até pague o tributo imunizado;
f) facultativa, eis que a pessoa beneficiada pode ou não valer-se da norma imunizante.
O escopo das imunidades tributárias está atrelado a conceitos de natureza política e social de determinada sociedade em dado momento histórico, com o intento de garantir liberdades individuais previstas na própria Constituição Federal através de exoneração de tributos para não macular a existência de direitos relevantes.
Destarte, as regras imunizantes sinalizam situações que prestigiam valores constitucionalmente inafastáveis, justificando, teleologicamente, as dispensas, como, verbi gratia, a liberdade de expressão, acesso à cultura, liberdade religiosa, pacto federativo, liberdade política e a difusão da educação e do ensino.
Não perca de vista que as principais imunidades atingem tributos e não apenas uma espécie deles. Porém, não restam dúvidas de que as principais imunidades, às quais nos ateremos neste trabalho, versam sobre impostos, consoante o artigo 150, inciso VI da Constituição Federal:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
Convém salientar que o artigo em comento trouxe a regra imunizante apenas e tão-somente aos impostos. A Constituição Federal refere-se a espécie "impostos" e não a taxas ou contribuições. Com relação aos demais tributos não mencionados no artigo supracitado, deve-se considerar que os mesmos são sinalagmáticos, portanto, tais gravames prevalecem sobre a regra imunizante. Sendo assim, pode-se cobrar uma taxa de uma igreja, ou mesmo cobrar a contribuição de melhoria de uma entidade sindical de trabalhadores.
2.1 Diferenças entre imunidade e isenção
Antes de diferenciarmos imunidade de isenção tributária, podemos fazer um paralelo entre tais instituições, pois tanto no caso de imunidade quanto na hipótese de isenção, pode-se afirmar que não há dever prestacional tributário. Neste aspecto, portanto, fica traçada uma semelhança entre as duas instituições expostas.
Cabe salientar que o paralelo supramencionado não se justifica, pois não há uma coadunação entre a sistemática da imunidade tributária e a de isenção. De acordo com Paulo de Barros Carvalho, podemos sublinhar apenas três semelhanças entre as duas instituições, quais sejam:
(...) a circunstância de serem normas jurídicas válidas no sistema; integrarem a classe de regra de estrutura; e tratarem de matéria tributária.(06)
Quanto ao mais, há grandes diferenças entre as duas espécies normativas, pois a imunidade tributária é norma constitucional, enquanto que a isenção se dá no plano da legislação ordinária.
Note que o artigo 9º, inciso IV, do Código Tributário Nacional, diz que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios "cobrar imposto"(07) e o artigo 150, inciso VI, da Constituição Federal traz a mesma vedação, mas no sentido de "instituir imposto."(08) Diante dessas divergências, podemos concluir pela plausibilidade da nova redação trazida pela Constituição Federal, pois deve se vedar a decretação e não a cobrança do imposto decretado.
Portanto, as leis ordinárias que violam as regras imunizantes são inconstitucionais, ao passo que a infringência de lei que traduz a isenção importa em ilegalidade e não em inconstitucionalidade.
Em análise ao brilhante conceito de Paulo de Barros Carvalho, extraímos que as imunidades tributárias estão contidas na Constituição Federal. Sendo assim, cabe transcrever o trecho em que o autor elucida tal afirmativa:
O universo do direito brasileiro abriga muitas interdições explícitas que, num instante considerado, podem ter o condão de inibir a atividade legislativa ordinária, escala hierárquica em que nascem as regras tributárias em sentido estrito. Tão-somente aquelas que irrompem do próprio texto da Lei Fundamental, entretanto, guardarão a fisionomia jurídica de normas de imunidade. O quadro das proposições normativas de nível constitucional é seu precípuo campo de eleição.(09)
Em conclusão, convém transcrever o trecho digno de nota da ilustre obra de Aliomar Baleeiro:
As imunidades e as isenções (incluída a alíquota zero) são permissões explícitas do ponto de vista do contribuinte e configuram proibições ou deveres de omissão aos entes estatais. Uma proibição aos entes políticos da Federação de instituir imposto (no caso a imunidade) ou uma proibição à cobrança de tributo (no caso a isenção ou alíquota zero). Mas a situação do não contribuinte, do ponto de vista eficacial, não é diversa daquele isento ou imune. Apenas implícita.(10)
Em uma diferenciação mais simplista, o ilustre professor Eduardo de Moraes Sabbag, nos traz conceitos enriquecedores dos dois institutos:
Isenção - é um favor legal consubstanciado na dispensa de pagamento de tributo devido, isto é, a autoridade legislativa evita que o sujeito passivo da obrigação tributária se submeta ao tributo. Portanto, evita-se o lançamento.
Imunidade - é uma não incidência constitucionalmente qualificada. É o obstáculo, decorrente de regra da Constituição, à incidência de tributos sobre determinados fatos ou situações.(11)
Diante do exposto, podemos concluir que as imunidades tributárias são endógenas em relação às normas de competência tributária, pois lhes delimitam negativamente a extensão, atuando dentro delas para diminuir-lhes a eficácia.
Sobretudo, devemos considerar que as imunidades foram firmadas em considerações extrajurídicas, atendendo à orientação do Poder Constituinte Originário, em função das ideias políticas vigentes, preservando determinados valores fundamentais à sociedade brasileira.(12)
Portanto, se há isenção, não se pode falar em imunidade.(13)

fonte:  http://www.fiscosoft.com.br/main_index.php?home=home_artigos&m=_&nx_=&viewid=259668&o=4



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